segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

A APOSTA DE PASCAL (EM DEUS)

Estava, hoje à tarde, na antessala do Dr. Eduardo Arrais Rocha, o competente cardiologista que implantou o marcapasso que me mantém vivo, e, inevitavelmente, ouvi uma conversa entre dois colegas implantados (com cardioversor e desfibrilador)
Seu Murilo (76 anos) dizia para D. Neide que estava desesperançado com o que via e que tinha horas que não acreditava mais em Deus.
Pedi desculpas e me meti na conversa. Perguntei a ele se sabia o que era Esperança Matemática.
Diante de uma negativa, passei a expor, de forma breve, A Aposta de Pascal.
Blaise Pascal, grande físico, filósofo e matemático que viveu no Século XVII, deixou, costuradas no forro de seu inseparável sobretudo,  duas folhas de pergaminho datadas de 23/11/1654 - oito anos antes de sua morte. Nele, estava escrito um relato de um transe em que recebeu uma revelação divina que o afastou dos caminhos do mal. Jogador inveterado, ele levara, até então, uma vida inútil, vivendo de herança e de farra.
Depois disso, vendeu tudo que tinha, doou o dinheiro aos pobres, passou a viver de muito pouco e até de esmolas e se dedicou exclusivamente à filosofia e à moral, denunciando, inclusive a ciência.
Deixou suas ideias sobre Deus, a religião e a vida na sua obra Pensamentos.
No best-seller O Andar do Bêbado (nas livrarias), Leonard Mlodivow explica o argumento assentado nas duas folhas manuscritas encontradas, poucos dias depois de sua morte, no forro do casaco que Pascal sempre usava.
Reproduzo aqui (trechos em vermelho - as observações em preto são minhas), o curto relato de Mlodivow:

"Nessas páginas, Pascal detalhou uma análise dos prós e contras de nossos deveres para com Deus como se estivesse calculando matematicamente a sabedoria de um apostador. Sua grande inovação foi o método de contrapesar esses prós e contras, um conceito chamado atualmente de esperança matemática.
   O argumento de Pascal era o seguinte: partamos do pressuposto de que não sabemos se Deus existe ou não e, portanto, designemos uma probabilidade de 50% para cada proposição."

Pascal propôs que a chance de Deus existir é de 50% e de Ele não existir é igual, 50%. Meio a meio.
Temos, então:
             1/2 Deus existe + 1/2 Deus não existe = 100%

"Como devemos ponderar essas probabilidades ao decidirmos se devemos ou não levar uma vida pia? Se agirmos piamente e Deus existir, argumentou Pascal, nosso ganho - a felicidade eterna - será infinito. Se, por outro lado, Deus não existir, nossa perda, ou retorno negativo, será pequena - os sacrifícios da piedade."

Assim, se você decidir respeitar os mandamentos de Deus, poderá ter ganhos infinitos, caso Ele exista e pequenas perdas, caso não exista.

"Para ponderar esses possíveis ganhos e perdas, propôs Pascal, multiplicamos a probabilidade de cada resultado possível (1/2) por suas consequências e depois as somamos, formando uma espécie de consequência média ou esperada. Em outras palavras, a esperança matemática do retorno por nós obtido com a piedade é meio infinito (nosso ganho se Deus existir) menos a metade de um número pequeno (nossa perda se Deus não existir). Pascal entendia suficientemente o infinito para saber que a resposta a esse cálculo é infinita, e assim, o retorno esperado sobre a piedade é inifinitamente positivo. Toda pessoa razoável, concluiu Pascal, deveria portanto seguir as leis de Deus. Hoje, esse argumento é conhecido como Aposta de Pascal."

Fica assim, a Esperança Matemática:

    EM = 1/2 x infinito - 1/2 x número pequeno = infinito

Ou seja, apostar que Deus existe é infinitamente mais vantajoso do que não. Mesmo para quem tem conhecimentos científicos e é cético, ainda assim é razoável apostar em Deus e esperar um retorno maior do que o contrário.

Agora, de volta ao consultório do Dr. Eduardo, lá no Prontocárdio (em Fortaleza).
Procurei evitar um cunho religioso na minha fala. O fato é que não sou lá muito religioso.
Na verdade, tentei mostrar as contas como quem está em um bate-papo de bodega, rabiscando em papel de embrulho, em frente a uma cerveja bem gelada.
Acho que Seu Murilo entendeu porque quando terminei, ficou um tempo pensativo, deu um largo sorriso, olhou para mim e disse que, de qualquer jeito, é melhor crer em Deus e fazer o que for melhor para todos.
Antes de sair, perguntou meu nome e o que eu fazia. Disse que sou professor de Direito da Unifor. Então, aumentou o sorriso, apertou minha mão com força e se despediu, pisando firme e com um ar de quem já tinha tomado uma decisão.
Não sei se afastou as dúvidas que tinha, mas estava com uma expressão desanuviada e com um leve sorriso no canto da boca. Virou-se e me desejou um bom Ano Novo. Devolvi.
Entrei no consultório com a sensação de um escoteiro (já fui) que fez sua boa ação do dia.
Discretamente, coloquei três dedos da mão direita na testa e murmerei para mim:
Sempre Alerta, meu amigo.

Um comentário:

  1. Post muito bom. Namastê! (saudação sânscrita que significa: O Deus que há dentro de mim saúda o Deus que há dentro de vc)

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