quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Fora de órbita




Meus caros coleggas e amiggos,

Abaixo, segue um extrato de artigo do Professor Ricardo Gesteira Ramos de Almeida, publicado no Jus Navigandi sobre as famosas Cláusulas Exorbitantes.
Espero que todos aproveitem bem.

4.CLÁUSULAS EXORBITANTES


4.1. LINHAS INICIAIS

O conceito originário de cláusula exorbitante, como elemento da própria teoria do contrato administrativo, não poderia haver nascido de outra mãe que não a doutrina francesa, a bem da verdade claramente fecundada pelas decisões do Conselho de Estado daquele país.

Por certo, deve-se aos juristas franceses a ideia de cláusula exorbitante como disposições de caráter incomum aos contratos de direito privado, seja por que neles seriam eivadas de nulidade, seja porque incompatíveis como a natureza da relação.

O Prof. Hely Lopes Meireles, seguindo a doutrina francesa, defende que:

As cláusulas exorbitantes não seriam lícitas num contrato privado porque desigualariam as partes na execução do avençado, mas são absolutamente válidas no contrato administrativo, uma vez que decorrem da lei ou dos princípios que regem a atividade administrativa e visam a estabelecer prerrogativas em favor de uma das partes para o perfeito atendimento do interesse público, que se sobrepõe sempre aos interesses particulares. [34]

De acordo com o mestre José Cretella Júnior:
[...] cláusula exorbitante do direito comum é toda proposição que se insere no contrato administrativo tipificando-o. A teoria da cláusula exorbitante ou derrogatória permite estabelecer a diferença entre o contrato administrativo e o contrato de direito privado, ou seja, os primeiros abrigam cláusulas especiais, que fogem do direito civil, configurando o regime jurídico especial de direito público. [35]
[...] Alguns autores definem a cláusula exorbitante como toda cláusula estranha ou desusada nos contratos de direito privado ou, em outras palavras, toda cláusula que, inserida num contrato de direito privado, iria atentar contra a ordem pública. [36]
Conforme a lição do Mestre Diogo de Figueiredo Moreira Neto [37], as cláusulas exorbitantes, na doutrina clássica, obedecem à seguinte tipologia:

Cláusulas de executoriedade – decorrem da lei, e não de imposição contratual. Se referem ao plano do exercício dos direitos. São extracontratuais, pois extracontratual é o privilégio da execução prévia (autoexecutoriedade);

Cláusulas de jus variandi – a possibilidade de alterar unilateralmente contratos, como expressão do império da administração – supremacia do interesse público.


A relevância do conceito das cláusulas exorbitantes para a própria "sobrevivência" doutrinária da dita teoria do contrato administrativo fica patente na emblemática lição do Prof. Edmir Netto de Araújo, que defende sem pudor que o instituto das cláusulas exorbitantes:

Trata-se do ‘divisor de águas’ entre o contrato de direito privado e o contrato de direito administrativo, que ainda suscita controvérsias entre os juristas, mas que permite reafirmar a posição de supremacia da Administração dentro do contrato, verticalizando o Estado em relação ao particular contratante, e deixando claro que a Administração, ao contratar, não abdica de sua puissance publique, mas que ao contrário, dirige o contrato, fiscalizando os atos do contratante particular, aplicando-lhe penalidades, concedendo-lhe benefícios, determinando-lhe procedimento, enfim, impondo-lhe sujeições com fundamento no interesse público. [38]


Conclui-se, portanto, que de acordo com a doutrina dita "clássica" sobre o tema - claramente pautada nos paradigmas do Estado Moderno, conforme se verá em momento oportuno - as cláusulas exorbitantes constituem elementos de caracterização do próprio contrato administrativo, sendo concebidas como o instrumento mais eficaz à garantia da posição de supremacia da Administração em relação ao contratante privado, permitindo-lhe moldar o acordo de vontades às eventuais variações do interesse público.

Ricardo Gesteira Ramos de Almeida - Advogado. 

Graduado em Direito pela Universidade Federal da Bahia - UFBA. 
Graduado em Extenção na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra - Portugal.
Pós-graduando em Direito do Estado pela Universidade Federal da Bahia - UFBA.
Professor convidado da FECAP/UNIDADE.