sexta-feira, 3 de setembro de 2010

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

"Não tenhas inveja daqueles que vivem num paraíso dos tolos, pois apenas um tolo o consideraria um paraíso."
do Decágolo de Bertrand Russell
um dos maiores filósofos do século XX


Olá amiggos,

Demorei, mas voltei.

Antes de abordar o tema da semana, quero agradecer aos meus ilustres colegas professores Carlos Eufrásio, pelo gentil comentário postado e publicado ao lado (eu mesmo ainda não tinha visto), e Henrique Erich, pelo e-mail muito estimulante que me enviou terça-feira. Agora, meu compromisso aumentou consideravelmente!

Preparei o tema da semana em homenagem a uma seguidora muito especial que não quer seu nome desvelado por encabulamento. Mesmo sem atuar na área, ela levantou questões interessantes sobre a matéria. Calhou, pois o estudo é fortuito. Basta olhar para os fatos recentes que envolvem figuras de porte da Administração Pública federal.

A questão enfocada por LL (nossa seguidora anônima) é referente às possíveis sanções aos agentes que incorrem na prática de atos qualificados como ímprobos. Mais especificamente quanto aos delitos criminais.

Primeiramente, vejamos o quê é improbidade para, depois, falar sobre as consequências. Probo é o agente público que age com integridade, ou seja, é honesto e tem respeito pela coisa pública, tratando-a sempre sem má-fé. Agir com probidade, portanto, é desempenhar as funções públicas com boas intenções, sempre atendendo ao Princípio da Moralidade, expresso no caput do artigo 37 da Constituição Federal.

Neste passo, é bom que se observe, no entanto, que a própria Carta evidencia que moralidade e probidade são valores que se distinguem, posto que, no mesmo artigo, especifica:

"§ 4º Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível."

Se o constituinte colocou a moralidade na cabeça do artigo e a improbidade em parágrafo do mesmo artigo, então quer dizer que uma é espécie da outra. Ou seja, a improbidade é uma espécie do gênero imoralidade. Melhor ainda, a imoralidade é mais ampla, enquanto a improbidade é mais restrita. Juridicamente, pois, uma não é sinônimo da outra, devendo, assim tratamentos diferenciados. Por isso mesmo é que o legislador imputou sanções específicas para os agentes que praticam atos de improbidade, em lei própria, como determina a Constituição.
Na Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/92), as hipóteses de ocorrência de improbidade estão divididas em três:

a) atos que importam em enriquecimento ilícito (Art. 9º);
b) atos que resultam em prejuízo ao erário (Art. 10);
c) atos que atentam contra os princípios da Administração Pública (Art. 11).

Vamos trocar em miúdos:

a) quando o agente público atua para obter vantagem usando o seu cargo. Qualquer tipo de benesse, quer seja em dinheiro ou outro tipo. A lei elenca 12 hipóteses, mas pode haver outras; o rol é exemplificativo. Um exemplo muito comum é o do prefeito da cidade que "rouba" e fica rico, do governador ou do presidente que deixa seus apaniguados encherem os bolsos enquanto esvaziam os cofres públicos para financiar suas campanhas e presenteá-los; além de improbidade, é crime!!!

O BRASIL CHORA TANTA CORRUPÇÃO !!!

b) quando o agente público, querendo ou não, dá causa a prejuízo ao Estado, quer seja por ação, quer seja por omissão. Uma situação típica é quando o engenheiro responsável pela fiscalização de uma obra deixa de impedir o uso de materiais de pouca qualidade, causando um desastre com prejuízos materiais e, às vezes, pondo em risco a vida de pessoas.

c) quando o agente público atua sem observar os princípios que norteiam a Administração Pública. Um exemplo é quando o servidor público que é dirigente de comissão de licitação não publica devidamente o edital, contrariando o Princípio da Publicidade, explícito no caput do artigo 37 da CF. Ainda mais, compromete a competitividade quando reduz a oportunidade de mais possíveis interessados no contrato, afrontando o Princípio da Igualdade e, também, o da Eficiência, pois reduz a possibilidade de se fazer mais com menos recursos.

Vejam a notícia que eu copiei da internet (G1) e colei abaixo:

"A segunda providência anunciada pela oposição foi uma representação à Procuradoria Geral da República (PGR) contra o secretário da Receita Federal, Otacílio Cartaxo, e contra o corregedor-geral do Fisco, Antonio Carlos Costa D’Avila, por improbidade administrativa. A oposição acusa os dois de obstruírem as investigações. O G1 procurou a assessoria da Receita Federal e aguarda resposta."

Se, repito e grifo, se as autoridades nominadas na notícia participaram - por ação ou omissão - da quebra de sigilo, certamente ofenderam de forma gravíssima princípios constitucionais, dentre eles os que afetam diretamente a Administração Pública, caracterizando improbidade administrativa.

O artigo 12 da Lei de Improbidade indica as penas para cada uma das 3 hipóteses mostradas, variando de grau de acordo com a gravidade, incluindo a perda de bens ou valores, ressarcimento ao erário, multa, perda da função e até a suspensão dos direitos políticos.

Note que as sanções independem das outras que podem resultar de processos civil, penal ou administrativo. Portanto, a improbidade administrativa é uma espécie de delito a que o nosso constituinte deu tratamento distinto, misturando as penas. A perda de bens é claramente uma sanção de natureza patrimonial, uma cominação civil, enquanto a multa tem natureza administrativa. Mais grave ainda é a perda temporária dos direitos políticos, o "ostracismo", que tem tal denominação devido aos gregos antigos que afastavam seus representantes mediante uma votação pública em que o eleitor rasbicava o seu voto na casca de uma ostra. Era a mais grave pena imputada a um cidadão grego: apartá-lo da sua venerada pátria. Pior do que a morte. Seria como ir para o inferno.
Aqui, no Brasil, o mais que nós estamos fazendo é mandá-los pro inferno das Bahamas com toda a nossa dinheirama. Respeite o inferno!

Quanto às sanções penais, devemos observar que a improbidade pode configurar crime, segundo as tipificações do Código Penal, na sua parte que cuida dos crimes contra a Administração Pública (Capítulo XI). Quando o agente público, por exemplo, pratica ato de improbidade administrativa por enriquecimento ilícito incorre em peculato (Art. 312, CP). Aí, deve ser instaurado o devido processo penal, independentemente da Ação de Improbidade Administrativa.

Ah, não posso esquecer, LL perguntou sobre a prescrição desses delitos administrativos.

Pois bem, ensinou-me meu grande mestre Valmir Pontes Filho que a prescrição, tal como a restrição de direitos, deve ser explícita em norma própria.

O artigo 23 cuida disso: cinco anos a contar do fim de mandato, no caso dos eleitos para cargos políticos, bem como para os que forem ocupantes de cargos comissionados ou que desempenhem uma função pública por designação. No caso dos servidores ocupantes de cargos efetivos por concurso público, deve-se observar a lei que dispõe sobre o seu próprio regime jurídico, ou seja, o seu estatuto.

Veja o do servidor federal:

"Art. 142. A ação disciplinar prescreverá:
I - em 5 (cinco) anos, quanto às infrações puníveis com demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade e destituição de cargo em comissão;
II - em 2 (dois) anos, quanto à suspensão;
III - em 180 (cento e oitenta) dias, quanto á advertência.
§  1o O prazo de prescrição começa a correr da data em que o fato se tornou conhecido.
§ 2o Os prazos de prescrição previstos na lei penal aplicam-se às infrações disciplinares capituladas também como crime.
§  3o A abertura de sindicância ou a instauração de processo disciplinar interrompe a prescrição, até a decisão final proferida por autoridade competente.
§  4o Interrompido o curso da prescrição, o prazo começará a correr a partir do dia em que cessar a interrupção."

A prescrição da instauração do pertinente processo criminal é disposta no próprio Código Penal, para cada caso tipificado.

Espero ter atendido às expectativas.

Em breve, voltarei para falar sobre licitações. Pode aguardar.


P.S.: meu filho, Renato, que visita o blog só pra tirar sarro, chamou minha atenção para o erro de digitação na saudação: o duplo "g" na palavra "amiggos"; é proposital, é o meu agradecimento aos criadores do Blogger, aplicativo do Google que permite qualquer otário, como eu, fazer o seu próprio blog, sem muitas complicações.

3 comentários:

  1. Acompanhei a evolução do post e gostaria de comentar que ele ficou bastante interessante, não apenas pelo visual (que está muito bem trabalhado), mas também pelo conteúdo, que é um tema que gera muitas questões e está relacionado com muitos acontecimentos recentes. Mais uma vez, parabéns. É sempre muito bom visitar este blog.

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  2. Prof. Alex,
    improibidade é um assunto que nos deixa um tanto quanto duvidosos.
    Obrigada pelos esclarecimentos.
    obs: tem um bolo chamado ''zebrinha'', me lembra uma certa aula de direito adm. II.
    Giovanna Leite

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  3. Professor Alexandre,

    Só para contribuir...
    Quanto a questão da prescrição narrada, representando uma boa notícia para a sociedade, há um Projeto de Lei n. 2333/07 (Deputado Praciano/MT), que amplia para 10 anos o prazo prescricional para se iniciar processos por atos de improbidade administrativa. Atualmente, o projeto segue para uma (breve e ) possível aprovação. Para quem quiser acompanhar: http://www.camara.gov.br/sileg/Prop_Detalhe.asp?id=374931
    Também temos a imprescritibilidade expressa no art. 37, § 5º das ações de ressarcimento que causem prejuízo ao erário.
    De fato essa matéria é muito atrativa, até para minha limitada atuação na parte constitucional.
    Mônica Mello

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